Então eles se separaram. O amor que – como a canção dizia – devia durar pra sempre e mais um dia chegou ao fim. Culpa de quem? De um? Do outro? Provavelmente dos dois.
E por quê? Tantas foram as razões. Paulo Mendes Campos escreveu que o amor acabava – por tantos motivos, o amor acabava. E o amor deles acabou.
E os estilhaços se espalharam. Para a alegria da cunhada ciumenta e invejosa, o amor deles acabou. Nunca fora amada e isso doía. Para a tristeza da priminha romântica, que sonhava em viver, um dia, um amor como aquele, o amor deles acabou. Para o espanto dos amigos mais íntimos e sinceros – bem poucos! – o amor deles acabou e deixou um tanto de angústia nos que queriam viver um amor igual.
O amor deles acabou e deixou uma das sogras aliviada – não gostava do genro. Enquanto isso, a outra ficou indiferente; ela, que, depois de três casamentos (traída em todos eles), desistira de procurar a felicidade nos braços de alguém. Um pai foi explícito: “Acabou? Quem sabe agora ele me dá um neto!”. O outro foi mais contido e pessimista: “Não podia mesmo dar certo…”.
O amor deles acabou e deixou órfão o apartamento montado, planejado pelo amigo arquiteto, com suas poltronas brancas e confortáveis, dispostas diante da TV enorme que lhes mostrava os melhores filmes e as melhores séries. A cozinha onde um deles cozinhava pratos deliciosos também se sentiu abandonada. O quarto ficou órfão também, com seus enormes armários que guardavam roupas e sapatos de grife. A cama “king size” em cima da qual seus corpos suados descansavam depois do sexo. O banheiro, onde os melhores perfumes, loções, xampus, sabonetes e cremes hidratantes enchiam os armários, não tem mais vida. Seus azulejos perderam o brilho. A banheira, enorme, onde eles muitas vezes se acariciaram e fizeram juras de amor, começa agora a ficar com uma cor esquisita.
Órfão, sentiu-se também o agente de viagens que organizara para o casal tantos passeios de avião, navio e ônibus para terras distantes, deste e de outros países. De clientes, tinham passado a amigos, com o correr dos anos e das viagens todas que fizeram.
O amor deles acabou e deixou marcas, claro! Um decidiu procurar outra pessoa, que esse negócio de ficar sozinho era coisa de celibatário; o outro recolheu-se, sem forças para uma busca, sem vontade de reviver tudo aquilo, uma preguiça íntima e cítrica de começar tudo de novo.
O amor acabou e muito ficou ainda no ar por ser dito. Uma conversa que ambos evitaram, olhos que não se encontravam, bocas que não se desejavam mais.
Em meio à reprovação de alguns amigos, o amor acabou. Ainda que alguns dissessem que aquilo era loucura, veio a separação. A cunhada conteve o riso, guardou a satisfação da separação só pra si, não ousou dividir com ninguém. A sobrinha de um deles chorou um pouco, coisa de adolescente que adorava dormir na casa dos tios.
As sogras nunca mais se viram e, caso tenham se encontrado na rua, no parque, no supermercado ou no shopping, fizeram de conta que não se conheciam. “O que eu ia falar com aquela mulher?”.
Eles nunca mais se viram. O que decidiu casar de novo foi transferido para trabalhar no sul – e lá se casou. O que precisava de um tempo sozinho ficou por aqui mesmo e, de vez em quando, ainda passa na frente do prédio onde foi feliz.
3 Comments
A Crônica caiu como uma luva para mim! Sou eu, sem tirar nem pôr – o amor acabou e ele está no ar. John Paul Young quem o diga.
Olá Prof Vitor
Excelente crônica, real, verdadeira, viva!!!!!
É a vida. Feita de acasos e coincidências.
Para sempre? Não. Apenas enquanto durar
(Vinicius de Morais).
Parabéns
Crônica maravilhosa, um final simples, cada um para um lado, sem arrependimentos, como têm que ser um final, obrigada.